O delegado-geral da Polícia Civil do Ceará, Sérgio Pereira dos Santos, disse na terça-feira (19) que a loja Zara utilizava um “código de discriminação” para dar tratamento diferenciado a pessoas fora do perfil de clientes desejados. O caso foi explicado em coletiva após a conclusão de inquérito que investiga crime de racismo contra uma delegada negra em uma loja Zara no Shopping Iguatemi de Fortaleza.
O delegado afirmou na coletiva que uma ex-funcionária da loja explicou como funcionava o procedimento. Quando se identificava alguém “fora do padrão” entrando, o sistema de som dizia a frase “Zara zerou”. “Isso era um comando que era dado pra que todos os funcionários da loja ou pelo menos alguns a partir de então começassem a observar aquela pessoa não mais como consumidor, mas como suspeito em potencial que precisava ser mantido sob vigilância da loja”, explicou o delegado.
As pessoas que o sistema alertava eram negras ou usavam “roupas simples”, diz o delegado. “A partir do acionamento do código Zara zero, a pessoa não seria mais tratada como um cliente, mas sim como alguém nocivo ao atendimento da loja e por isso teria que ser acompanhada de perto pelos funcionários ou até mesmo ser retirada do local de modo discreto. O alvo principal eram pessoas ‘mal vestidas’, dentro do padrão deles, ou pessoas negras”, diz. Para ele, as provas levantadas mostram que a Zara tinha “uma política de atendimento racista, preconceituosa e discriminatória”.
O caso com a delegada foi em 14 de setembro. A Polícia Civil indiciou o gerente da Zara, Bruno Filipe Simões Antônio, de 32 anos, por racismo. O crime de racismo pode gerar prisão de 1 a 3 anos e multa ao funcionário suspeito. A loja também pode receber uma punição cível.
Em nota, a Zara disse ontem que a abordagem da delegada não foi motivada por questão racial, mas seguindo protocolos de saúde. Disse ainda que não tolera discriminação racial.
Gerente indiciado
A delegada Ana Paula Barroso teve um tratamento diferenciado em relação a outras clientes que entraram na loja sem máscara, mesmo sem estar se alimentando, diz a polícia.
As imagens das câmeras de segurança mostram isso, afirma a polícia. “Nas imagens, é possível ver quando a vítima é expulsa do local, quando minutos antes, o mesmo funcionário atendeu uma cliente que, mesmo não consumindo nenhum alimento, não fazia o uso correto da máscara. A cena foi observada em outras situações onde outros clientes também não foram retirados da loja ou abordados para que utilizassem a máscara de forma correta”.
Oito testemunhas foram ouvidas, além da vítima e do suspeito. Uma mulher negra, de 27 anos, que relatou uma situação similar nas redes sociais está entre as pessoas que prestaram depoimento.
Leia a nota da Zara sobre o caso:
A Zara Brasil, que não teve acesso ao relatório da autoridade policial até sua divulgação nos meios de comunicação, quer manifestar que colaborará com as autoridades para esclarecer que a atuação da loja durante a pandemia Covid-19 se fundamenta na aplicação dos protocolos de proteção à saúde, já que o decreto governamental em vigor estabelece a obrigatoriedade do uso de máscaras em ambientes públicos. Qualquer outra interpretação não somente se afasta da realidade como também não reflete a política da empresa. A Zara Brasil conta com mais de 1800 pessoas de diversas raças e etnias, identidades de gênero, orientação sexual, religião e cultura. Zara é uma empresa que não tolera nenhum tipo de discriminação e para a qual a diversidade, a multiculturalidade e o respeito são valores inerentes e inseparáveis da cultura corporativa. A Zara rechaça qualquer forma de racismo, que deve ser combatido com a máxima seriedade em todos os aspectos.