Rosana Bispo, nora de Berlindo, exibe atestado de óbito e reclama de Rosana Bispo, nora de Berlindo, exibe atestado de óbito e reclama de “bandalheira”
Na série americana de TV “The Walking Dead” zumbis esfomeados tentam devorar as pessoas que sobreviveram a um estranho cenário de apocalipse. No município de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (RMS), os mortos têm se dedicado, há anos, a votar.
Uma lista com 30 eleitores-fantasmas (“mortos” que votam) foi elaborada pelos diretórios locais do PV e PSDC, devidamente documentada, e enviada ao Tribunal Superior Eleitoral pelos partidos com a reclamação que o Tribunal Regional Eleitoral não tomou providências para coibir o problema, denunciado, inicialmente, em 2004.
Naquele ano, uma Correição foi realizada na 33ª Zona Eleitoral de Simões Filho após a denúncia. Ao final do trabalho, o TRE anunciou que 9.714 títulos eleitorais foram identificados como irregulares e cancelados. Contudo, desse total, quase cinco mil continuaram aptos a participar das eleições e em condições para votar em 2016, inclusive os 30 mortos. Os partidos dizem que os fraudadores inseriram no cadastro os títulos falsos após a Correição. Segundo a legislação, quando o eleitor não vota em três eleições consecutivas e não justifica, tem o título cancelado. Cinco eleições – sem contar o segundo turno – já ocorreram de 2004 até o presente momento, ou seja, todos os títulos já deveriam ter sido cancelados.
Títulos duplicados
Quem descobriu as distorções na Correição de 2004 do TRE foi o advogado José Wilson Almeida Santos. Ele havia trabalhado com o vereador Jackson Bonfim que, em junho de 2004, denunciou a existência de cinco mil títulos eleitorais em duplicata, noticiado pelo jornal A TARDE em julho daquele ano. A partir dessa denúncia a Corregedoria Regional Eleitoral designou uma comissão especial para apurar o caso que cancelou os 9.714 títulos, definindo em 66.742 o número de títulos aptos a votar ao invés de 61.786 mil . Na ocasião, a Procuradoria Regional Eleitoral constatou, que a dita Comissão não instaurou “sequer uma sindicância” para averiguar “os responsáveis pelas sérias irregularidades aqui apontadas”.
Ao checar a situação atual dos eleitores inscritos a votar em Simões Filho, o advogado Santos descobriu que dos 9.714 títulos supostamente cancelados, 4.756 continuam aptos a votar. Santos mostrou a situação a Paulo Sérgio Pessoa, do diretório do PSDC e os dois passaram a investigar o caso. Aí chegaram aos 30 mortos entre os aptos a votar. Eles reuniram cópias autenticadas de 26 atestados de óbitos de pessoas que constam como votantes em Simões Filho, segundo o cadastro da Justiça Eleitoral. Mesma situação de outros quatro eleitores mortos cujos atestados tentam obter , mas que só descobriram o ano dos óbitos (veja os quatro últimos nomes da lista ao lado).
Peso
Os dois assinalam que o suposto número de títulos falsos – que equivale a quase 8% do eleitorado de Simões Filho – confere um peso fundamental para definir uma eleição de prefeito. No último pleito, 2012, o candidato eleito obteve 30 mil votos e o segundo colocado 25 mil. Com esses 4.738 votos que deveriam estar cancelados, seria possível eleger os três vereadores com maior votação em 2012: o primeiro colocado recebeu 1.520 votos, o segundo 1.462 e o terceiro 1.405.
Na representação ao TSE, o PSDC e o PV pedem a apuração das “responsabilidades funcional, civil e criminal de todos os implicados, juízes eleitorais inclusive”, além de “Correição Geral no Cartório da 33ª Zona Eleitoral a ser efetivada por servidores indicados por essa Corte Superior, a imediata instalação do Sistema Eleitoral Biométrico com vistas às eleições municipais de 2015 e o afastamento das atividades perante a zona eleitoral de todos servidores da prefeitura de Simões Filho”. O corregedor eleitoral Fábio Alexsandro Bastos pediu informações ao juiz da 33ª Zona Eleitoral que tem prazo de cinco dias para se pronunciar. No TSE a relatora do processo é a ministra Maria Thereza Moura, que o remeteu para a Procuradoria Geral Eleitoral.
Fraude eleitoral surgiu com a República Velha
A fraude eleitoral existe desde a República Velha que encerrou a monarquia em 15 de novembro de 1889. A mais tradicional era a “bico de pena” efetivada com a adulteração das atas elaboradas pelas mesas eleitorais, responsáveis pela apuração dos votos. Nesse cenário os mortos e ausentes já “votavam”.
O processo era todo controlado no interior pelos “coronéis” que através do “voto de cabresto” indicava quem o eleitor deveria votar. Havia ainda a fraude que consistia em dividir entre candidatos em conluio os votos em branco e nulo, evidentemente com mesários cúmplices.
Mesmo a atual urna eletrônica que o TSE considera à prova de fraudes, não deixa os candidatos seguros, tanto que tentaram aprovar na última minirreforma um comprovante em papel do voto, ponto vetado pela presidente Dilma Rousseff sob a alegação que iria causar despesas. (A TARDE)