Por, Eliane Cerqueira.
Na África, àkàrà (bola de fogo), no Brasil acarajé, prato abençoado, oferecido a Iansã, rainha dos raios, guerreira das ventanias, mulher mais poderosa da África negra, orixá feminino mais popular entre os mitos da Umbanda e do Candomblé. Através desse alimento, os adeptos de Iansã se aproximam dos seus deuses e dão sentido ao seu universo religioso.
“Oyá, Oyá ela é dona do mundo. Oyá, Oyá mãe Oyá venceu guerra”. São muitos os cantos entoados em homenagem a Iansã, por aqueles que não enxergam esse alimento, apenas, como uma forma de subsistência, mas como um bem cultural, repleto de tradição e significados que os auxiliam no culto dos orixás.
O acarajé não é somente um prato típico da Bahia, esse alimento expressa valores culturais que perpassam o simples ato de se alimentar e contribui para a formação da identidade cultural do povo baiano. Identidade passada de geração em geração e que durante a história da nossa sociedade e, principalmente, da sociedade baiana tem desempenhado um papel de extrema importância, no que tange a redescobrir costumes e revelar a identidade de um povo que procura manter vivas suas raízes.
No seu preparo, ingredientes como o azeite de dendê e o feijão, são tidos como primordiais. O feijão se encontra associado a divindades como Obaluaê que é representado pelo feijão preto. Yemanjá, rainha e dona do feijão branco e Iansã senhora do feijão fradinho. É notório perceber através dessas associações que os aspectos culturais e religiosos estão intrínsecos na nossa alimentação, definindo assim, o que comemos, por que comemos e quando comemos.
Muitos, ainda no Brasil, oferecem alguns alimentos a entidades religiosas como o caruru oferecido Cosme e Damião. Ao redor do mundo, são muitos os alimentos proibidos ou abençoados por estarem associados a entidades religiosas. Um bom exemplo disso é a carne de boi, amada pelos brasileiros, mas proibida na cultura indiana por estar associada a deuses importantes para o povo Hindu.
Os hábitos alimentares sempre ultrapassam a simples ação de adquirir os nutrientes necessários ao organismo e nos ajudam a perceber que esse ato está atrelado a grandezas sociais, culturais e religiosas que apesar de sofrer transformações ao longo da história, marca a identidade cultural de um povo.
Refletir acerca do significado de cada prato, o que está envolto no seu preparo, e o seu significado para determinada comunidade, nos faz navegar no tempo e voltar na história da formação do nosso povo. É claro que nem todos concordam ou aceitam determinadas associações entre alimentos e alguns deuses adorados em religiões diferentes, mas o importante é entender e respeitar as crenças e motivações que levaram cada cultura a pensar dessa forma.
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Por, Eliane Cerqueira.
Letróloga, licenciada em Letras pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Bacharelanda em Nutrição pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), amante das línguas estrangeiras (inglês e espanhol), com experiência no exterior e atuação na Educação Infantil, fundamental I e II, ensino médio e pré- vestibular. Já foi integrante do Movimento de Expansão da Língua Espanhola na Bahia e participou dos seguintes projetos de pesquisa: Avaliação do uso de medicamentos por usuários do programa Hiperdia de Santo Antônio de Jesus – BA e Censo das Manifestações Culturais Negras nos Estados da Bahia (UFRB). Atualmente, se dedica aos estudos voltados para Atenção a Saúde e Nutrição.
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