O Brasil deve bater o recorde em mortes por dengue neste ano e pode ultrapassar, pela primeira vez, o número de mil óbitos anuais.
Até o dia 19 de novembro, quando foi divulgado o mais recente boletim do Ministério da Saúde, haviam sido registrados 975 óbitos, muito próximo das 986 mortes ocorridas em 2015, o maior índice desde que a doença ressurgiu no país, na década de 1980. O número já é quase quatro vezes maior que o total de mortes do ano passado, quando houve 246.
A maior incidência de dengue acontece em um momento em que o Brasil enfrenta também uma retomada da pandemia de Covid-19. Em algumas cidades, as prefeituras estão sendo obrigadas a readequar o sistema de saúde para as duas doenças.
“Estamos tendo a confluência das duas, o que é consequência da má administração da saúde pública. No caso da dengue, é uma situação trágica, pois nunca matou tanto quanto agora”, disse o infectologista Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).Segundo os dados do Ministério, o número de casos prováveis de dengue cresceu 175,1% neste ano, em comparação com o do mesmo período de 2021, com 1,39 milhão de casos, incidência de 651,9 por 100 mil habitantes.
A região Centro-Oeste é a mais crítica, com incidência de 1.977 casos por 100 mil moradores, seguida da região Sul (1.041,2 por 100 mil). A cidade paulista de Araraquara tem a maior incidência por município — 8.754,4 por 100 mil habitantes —, seguida pela também paulista São José do Rio Preto — 4.199,1 por 100 mil.
Com 323,9 mil casos positivos da doença, o estado de São Paulo detém o maior número de mortes por dengue, com 276 registros, segundo o Ministério, seguido por Goiás (151), Paraná (108), Santa Catarina (88) e Rio Grande do Sul (66).
No país, outros 99 óbitos estão em investigação. Houve ainda 85 mortes por chikungunya. As duas doenças são transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, que se prolifera com mais facilidade em condições de calor e umidade, como ocorre atualmente.
O aumento nos casos de dengue levou a Sociedade Brasileira de Infectologia a divulgar um alerta nacional para lembrar que o quadro é preocupante e reforçar a necessidade da adoção de medidas preventivas contra a doença.
“É urgente que tenhamos uma política de retomada efetiva para combater o vetor da dengue (o mosquito Aedes aegypti). A situação é crítica, por isso fizemos esse alerta nacional”, disse Barbosa.
Ele lembrou que, em junho deste ano, quando a letalidade já superava a casa das 500 mortes, a SBI avisou da necessidade de reforçar a prevenção.
Outro aspecto observado, segundo ele, é que a dengue não está restrita a regiões quentes do Brasil, um sinal de que as mudanças climáticas têm afetado o risco de proliferação do mosquito. Os estados do Sul, por exemplo, apresentam índices expressivos, no interior ou no litoral, o que expressa mais uma preocupação dos especialistas.
Além disso, segundo o infectologista, a atenção tem de ser permanente.
“Precisamos de recursos para o controle da dengue, que é uma doença que pode ser grave e levar a óbito. Todas as pessoas estão suscetíveis, e a conscientização é indispensável”, disse.
Para o infectologista, embora sejam doenças distintas e sem um elo entre elas, tanto a Covid-19 quanto a dengue podem ser controladas com medidas preventivas.
“No caso da Covid, é ter a população extremamente vacinada com dose de reforço, vacinar crianças de 0 a 3 anos, ampliar o acesso à vacina bivalente e à medicação já disponível e fortalecer as medidas preventivas, como máscara, para a população mais vulnerável. No caso da dengue, é acabar com os criadouros do mosquito e acelerar a aprovação de vacinas”, diz.
Em Araraquara, líder nacional em incidência de dengue, os casos de Covid-19 explodiram, e saltaram de 97 na semana de 4 a 10 de novembro para 916 na semana de 25 de novembro a 1º de dezembro.
O índice de resultados positivos saltou de 8,4% para 26,7%. Na sexta-feira, 14 pacientes estavam internados com a doença, sendo 11 em enfermaria e três em UTI. Houve duas mortes.
Desde o dia 28 de novembro, o uso de máscaras voltou a ser obrigatório no transporte público, nos prédios públicos municipais e em todas as escolas. A partir de ontem, a vacinação dos públicos infantil (a partir de 3 anos) e adulto foi levada à praça Santa Cruz, das 17h30 às 20h30, aproveitando o horário especial do comércio de fim de ano.
Já sobre a dengue, a prefeitura informou que os números atuais foram influenciados pela epidemia registrada no primeiro semestre deste ano. Em julho, o índice começou a cair.
“Mesmo tendo superado o movimento de epidemia, as equipes de controle de vetores não interromperam as ações de combate ao mosquito e de avaliação dos índices de larvas. São mantidas as vistorias de casa em casa todos os dias do ano”, disse.
Com a queda no número de casos, o “dengário” foi desativado e o atendimento é feito em todas as unidades de saúde, onde também são atendidos casos de Covid. A cidade registrou 21.058 ocorrências e 19 mortes por dengue neste ano.
A Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo informou ter liberado recentemente R$ 93 milhões para os municípios paulistas em apoio às ações de combate ao mosquito da dengue e para ampliar a vacinação contra a Covid-19.
De 21 a 26 de novembro, foi realizada a Semana Estadual de Mobilização de Combate ao Mosquito, que envolveu prefeituras e organizações públicas. A pasta lembrou que o enfrentamento ao mosquito da dengue é uma tarefa contínua e coletiva.
Quanto à Covid-19, a Secretaria informou que monitora o cenário epidemiológico em todo o território estadual e reforçou a importância de a população procurar os postos para tomar as doses de reforço da vacina, que evitam os casos mais graves da doença. Conforme a pasta, é grande o número de pessoas sem o reforço.
“A quantidade de pessoas aptas a tomar a primeira e a segunda dose adicional do imunizante, mas que ainda não o fizeram, totaliza respectivamente 10 milhões e 6,7 milhões no estado”, disse.
O Ministério da Saúde informou que monitora de forma constante a situação epidemiológica da dengue em todo o país. A pasta afirmou que investe em campanhas que orientam sobre a prevenção e distribui inseticidas e larvicidas aos estados, além de realizar periodicamente a avaliação do cenário nacional.
Ainda segundo a pasta, também em relação à Covid-19 são desenvolvidas estratégias de combate, o que inclui distribuição de vacinas, medicamentos, testes, habilitação de leitos e repasse de recursos para os municípios.
Para garantir a continuidade da imunização e a máxima proteção contra a Covid, a estratégia de vacinação para o próximo ano já foi discutida pelo PNI (Programa Nacional de Imunizações). Também foram incorporados ao SUS (Sistema Único de Saúde) medicamentos para o tratamento da Covid-19.