A Covid-19 ainda é uma doença nova, mas os médicos já sabem que parte do grupo que se recupera acaba desenvolvendo sequelas. Por isso, é tão importante chegar cedo a um diagnóstico para, em seguida, começar a reabilitação.
Durante quatro meses, a família foi só um retrato na parede e uma saudade dolorida. Foram 60 dias isolado e intubado. O cozinheiro Rui Brito precisou até de traqueostomia, porque os pulmões foram tomados pela inflamação. Mas a cicatriz do orifício na garganta não foi a única marca que a Covid deixou. Do hospital, ele foi direto para o centro público de reabilitação Lucy Montoro. Chegou de ambulância.
“É um nascimento. Porque você vai aprender a andar, aprender a falar, aprender a comer, eu não comia com as minhas mãos”, conta Rui.
Exercícios diários, terapias, medicamentos. Recuperar o que a Covid tirou pode ser uma batalha longa, difícil e que precisa começar logo.
“É fundamental que a estratégia de reabilitação esteja inserida já na UTI, durante o tratamento crítico desses doentes. Quando há o atraso do diagnóstico dessas sequelas pós-Covid, os pacientes não só chegam muito mais debilitados, como também o tempo que eles precisam se recuperar é maior, e a certeza de recuperação também não é tão grande”, explica Fernando Ribeiro, fisiatra do Instituto Lucy Montoro.
Enquanto pacientes como o Rui enfrentam as sequelas da Covid, médicos do Hospital do Clínicas de São Paulo pesquisam esses danos de longo prazo. Os estudos mostram que cerca de 40% dos doentes continuam com alguns sintomas ou desenvolvem novos problemas ligados à Covid depois que deixam as UTIs e as enfermarias. E todos eles exigem atenção e cuidados.
O vírus, que entra no corpo pelas vias aéreas, penetra nos pulmões e é disseminado no organismo pela circulação. As inflamações provocadas pelo coronavírus podem atingir vários órgãos: coração, rins, o cérebro. Pode também provocar tromboses que dificultam ou impedem a passagem do sangue. As consequências de longo prazo que os pesquisadores mais estão encontrando são fraqueza muscular e cansaço; alterações neuropsiquiátricas, como dificuldade de concentração, depressão, ansiedade e pânico; taquicardia frequente; e inflamação, que pode gerar fibrose pulmonar.
“Então o mecanismo é a disseminação desse vírus, atacando diferentes órgãos e, a partir daí, deixando alguma cicatriz nesses órgãos e com algum grau de perda funcional”, explica Carlos Carvalho, diretor de pneumologia do Incor.
O médico, que é um dos coordenadores do estudo com ex-pacientes de Covid, chama a atenção das autoridades e serviços de saúde para as necessidades desses doentes.
“Então o serviço de saúde vai ter que ter ambulatórios ou estar preparado para receber esses pacientes por um período. Ou pelo resto da vida, dependendo da sequela que ficar”, avalia Carlos Carvalho.
Das 16 pessoas da família que tiveram Covid, o caso de Rui foi o mais grave. A alta do hospital foi uma festa, mas ele sabe que a luta pela saúde vai ter que continuar.
“A mensagem que eu deixo é para aqueles que não estão tendo consciência da coisa, que tenha consciência. Porque a pessoa faz aglomeração, hoje ele pode estar bem, amanhã ele pode estar mal. Hoje ele está bem aqui fora, ele vai para casa, ele leva para o parente. Essa doença vai espalhando”, conta. (G1)