Diretora do Couto Maia desabafa: ‘jovens têm a sensação de que o Covid não pega neles e não é verdade’

A médica infectologista Ceuci Nunes, diretora-geral do Instituto Couto Maia, fez um desabafo contra as pessoas que não estão levando a pandemia do coronavírus a sério em meio a alta de casos de Covid-19. Em entrevista a Mário Kertész hoje (17), durante o Jornal da Bahia no Ar da Rádio Metrópole, ela afirmou que a todo momento o número de casos aumenta, mas que a população não se conscientiza disso.

“O Couto Maia está com uma ocupação muito alta. Hoje amanhecemos com 12 vagas, que é uma coisa até grande para o que a gente tem visto esses dias. O que a gente tem é uma rotatividade grande de pacientes. Muitos pacientes têm alta ou morrem. Eu acho que a situação que a gente está vivendo é extremamente grave e as pessoas precisam entender isso”, disse a diretora da unidade, que é uma das referências no tratamento da doença.

Ceuci ainda lamentou a posição do presidente Jair Bolsonaro, que se mantém negacionista em relação à pandemia.

“Eu queria muito que todas as pessoas, inclusive o presidente da República, tivessem a oportunidade de passar uma hora dentro de uma UTI Covid. Primeiro utilizando aqueles equipamentos de proteção individual, que você tem que trocar alguns deles de pacientes para pacientes. Isso é um stress grande de paciente para paciente. Isso já é um stress grande. Ficar com aquela máscara N95 que marca o rosto das pessoas”, afirmou. 

“Outra coisa, uma UTI Covid não é uma UTI normal. Numa UTI normal, de outras doenças, a gente tem, de cada 10 pacientes, três pacientes em estado muito grave. Numa UTI Covid, a gente sete de cada dez em estado muito grave. Isto é uma sobrecarga para a equipe de saúde imensa. E vamos fazer um ano nisso. Quem pode aguentar? Tem dia que eu chego em casa parecendo que eu tomei uma surra de cipó de aroeira, de stress e com os músculos doendo. Isso acontece com a equipe toda”, acrescentou.

Ceuci lamentou que as pessoas mais jovens não estejam levando a pandemia a sério. Segundo ela, há registro de casos de pessoas de faixa etária entre 30 e 40 anos, sem doenças pré-existentes e saudáveis, que vieram a óbito em decorrência do coronavírus. “A gente vê o sofrimento, com as pessoas chegando gravíssimas, com o pulmão praticamente destruído, jovem e velho. Os jovens têm a sensação de que o Covid não pega neles e não é verdade. Há duas semanas nós perdemos um rapaz de 35 anos, malhado, que fazia atividade física regular e que não tinha nenhuma doença. O estrago pulmonar foi tão grande que a gente não teve como tirar”, declarou a médica.

“Não dá para a gente sair do hospital nesse stress medonho que estamos vivendo e ver a população vivendo como se nada tivesse acontecendo. Sem usar máscara, usando máscara com o nariz de fora, uma coisa absurda, indo para festa e paredão, levando a doença para dentro de casa e mais vulneráveis. Eles mesmos se contaminando. Isso tudo vai para o colo dos profissionais de saúde, que não aguentam mais. Me desculpe, isso é um desabafo. Não dá mais, ou a gente compreende o momento de gravidade que a gente está vivendo ou eu não sei o que a gente vai ser. Eu acho que preciso de um ano de férias para me recuperar dessa catástrofe.”

A médica infectologista ainda avaliou o potencial de risco da variante do vírus identificada em Manaus. Segundo ela, as informações sobre o grau de letalidade da cepa ainda não é conhecido. No entanto, o momento requer cuidado. “A gente tem a cepa de Manaus, que é mais infecciosa, mas a gente não sabe ainda se é mais letal. As cepas existem porque o vírus está circulando muito. Quanto mais ele circula, mais a possibilidade de ter mutação. A gente não tem vacina e não sabe se é mais grave ou não. A gente fica cheio de interrogação e ontem o Brasil assumiu o pole position em novos casos de Covid. Provavelmente vamos ser, se as coisas continuarem, vamos ultrapassar a Índia e os EUA em números de casos. Os EUA estão vacinando e a pandemia está caindo. Ontem no site da OMS e vi que a pandemia está em decréscimo em todo o mundo, menos no Brasil. O Brasil é o único que a pandemia está estacionado num patamar altíssimo. Não é possível que as pessoas não enxerguem isso, acabaram com o Ministério da Saúde. Lá não tem mais nenhum técnico e os que sobraram estão sofrendo com pressão para coisa inútil. É desesperador, sinceramente”, declarou Ceuci.

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